Ontem viveste enjoado como se duma gravidez se trata-se. Oito, são os meses acumulados em dunas de terror. O sol já alto, jaz em tua pele em flagelos alheios á luxúria da cama que deixas-te para trás.
São oito da manhã, oito badaladas, sem ritmo algum. Arrancas da memória o badalo que injectas em ti, uma vez que trabalha como calmante, ao pesadelo abraçado a ti.
... À pouco mais de oito meses, uma lágrima caiu... Já és soldado, juraste defender tua pátria, dos monstros e de contos sem fim. Essa foi somente uma lágrima de emoção a qual não faz mal ao ego nem ao coração.
Recrutaste, rompendo todos os obstáculos que se apresentaram. Marchas-te barbialçado, respiraste orgulho. Rasgando os medos, defrontaste o perigo com serenidade mas com alma de leão. Existiram barreiras impressionantes, alicerces de luta pela sobrevivência que jamais imaginaste triunfar. Venceste! Coroado de soldado, um escudo contra o inimigo.
... À oite meses atrás recebeste a noticia... Apto para combater o verdadeiro inimigo nos desertos cálidos, de gelo entranhado entre os dentes, onde as noites rugem no cristal que é diamante.
Abandonaste o que te era querido, e a luxúria que te cobria. És soldado, tiveste que partir.
Engomado na sabedoria, guarnecido em artilharia, com espírito de valentia. Foste ao encontro dum conto “d’as mil e uma noites.” Noites de dragonetes esvoaçando o teu cérebro, aventuras no leito, boiando no leite derramado extraído do peito; onde não existem dimensões muito menos corações.

Bem vindo, conseguiste penetrar na auréola celestial do pesadelo real.
Consciente estavas na solidez da tua aprendizagem, nos muscúlos desprendidos, na tua força capaz. Se estavas! Acreditaste no dispor das tuas capacidades mentais e fisicas. Na palma das tuas mãos se podia encontrar uma a uma as regras da rudez. Alheio à cegueira da dor esfarrapavas as teias do sofrimento. A fragrância do medo nunca te enjoou.
Jamais te passou pela cabeça, que nesta guerra louca, remorsos de culpabilidade te podessem impotar a respiração. Nunca imaginaste poder sentir-se linhas de algofobia entrar de mansinho pelas córneas adentro, paralisando as entranhas, num continuamento de choque. Convulsões de dor arder no peito, a culpa a colar-se ás paredes da pele suada.
Não foi algo imagário pelo contrário, o teu calvário. Desabaste lentamente num choro desprendido de mil golpes com oito tenras almas vigilantes.
Dizem por aí que o Homem não chora ou não deveria de chorar, mas quando a dor esfaqueia o coração é algo difícil de controlar.
II Parte
Faz hoje um mês que começas-te a perder a vontade de viver. Se continuas-te nesta guerra, foi por obrigação, o juramento por ti abraçado e porque és soldado. O combate agora resume-se somente por tua própria sobrevivência. Não é por cobardia... Tua alma ficou enterrada no desabamento do teu próprio inferno.
Eram umas sete da noite, depois de caminharmos por horas a fio sobre as escaldantes areias do deserto. Eu, juntamente com três companheiros de batalha demos de caras com uma fantasmagórica pequena aldeia ou o que restava dela. Vigilantes, começamos nossa busca naquele deserto de escombros, abandonado.

Não consigo perdoar-me, por tamanha maldade por mim cometida. Dizem que me defendi, que estes meninos eram soldados bem capazes como qualquer homem maduro da guerra. Mas digam o que disserem nada nem ninguém poderá dizer que eu não assassinei uma criança de oito anos sendo a mais velha não mais que doze anos. Estava bem preparado para esta guerra, mas era, pensava eu, uma guerra de adultos brutos.

Pregunto-me dia após dia se terei perdão, se quando sair desta diabólica parte do planeta e entrar na luxúria do meu, se conseguirei alimentar o homem que era, o pai babado, e o marido amoroso, que sempre fui.

Não sei... não sei, se serei capaz... agora só me restam as lágrimas que meus olhos brotam cada dia que passa. As lágrimas d’um soldado.
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